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Lideranças Yanomami enviam mensagem com reivindicações ao presidente eleito, Lula 4mq3h

Em vídeo, Davi Kopenawa, José Yanomami e Aristeu Yanomami pedem a retirada dos garimpeiros e a melhoria das condições de saúde na TIY

Débora Pinto ·
14 de novembro de 2022 · 3 anos atrás

As lideranças indígenas do povo Yanomami Davi Kopenawa, José Yanomami e Aristeu Yanomami registraram, em vídeo, suas principais reivindicações ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

A produção, que tem o nome “Outubro 30”, foi realizada pela Hutukara Associação Yanomami na comunidade Watoriki, na Terra Indígena Yanomami, a maior do Brasil, com aproximadamente 9,6 milhões de hectares,  localizada  nos estados do Amazonas e Roraima, no extremo norte do país. “Nós, Yanomami, habitantes da Terra, confiamos em você, porque você é defensor da Terra-floresta. Eu estou feliz, sou habitante da floresta. Quero viver com saúde, quero continuar vivo. Quero criar os meus filhos. É isso que eu quero”, explica Luiz Yanomami no vídeo, saudando a vitória de Lula. 

A principal reivindicação dos indígenas ao presidente eleito diz respeito à retirada de garimpeiros de dentro da TI Yanomami. Estima-se que existam pelo menos 20 mil destes atuando ilegalmente no território atualmente, um número que aumentou de forma expressiva na gestão do atual presidente Jair Bolsonaro. 

De acordo com informaçoes do Instituto Socioambiental (ISA), entre 2020 e 2021, o garimpo ilegal avançou 46% na Terra Indígena Yanomami (TIY). Entre 2019 e 2020, já havia sido registrado um salto de 30%. De 2016 a 2020, o garimpo contou com um acréscimo de 3.350% na área. Em dezembro de 2021, mais de 3,2 mil hectares já haviam sido devastados pela atividade no território de acordo com o relatório  “Yanomami Sob Ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo” divulgado em abril pelo ISA. 

O número de comunidades afetadas diretamente pelo garimpo ilegal soma 273, abrangendo mais de 16.000 pessoas, 56% da população indigena total. Existem mais de 350 comunidades indígenas na TI, uma população que soma aproximadamente 29 mil pessoas.

Além da devastação ambiental, o garimpo também leva a  violência para as comunidades da TI. Em maio de 2021, um ataque a tiros à comunidade Palimiu, às margens do rio Uraricoera, explicitou uma intrincada rede de criminalidade estabelecida juntamente com a atividade minerária ilegal, icluindo ligações com facções criminosas do tráfico de drogas com comando em São Paulo. 

Sobrevoo regista áreas de garimpos ilegais dentro da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, em abril de 2021.

Dentre as ações de Bolsonaro com efeitos diretos sobre o território que levaram, ainda segundo o ISA, a maior invasão ao território Yanomami desde que foi demarcado em 1991, estão políticas de governo que resultaram no enfraquecimento da fiscalização ambiental, o afrouxamento de normas ambientais, na diminuição drástica de multas por crimes ambientais e na defesa da mineração em Terras Indígenas, não apenas de forma recorrente e retórica mas, também, de forma operacional com a proposição do Projeto de Lei 191/2020. Em março de 2022, a Câmara aprovou a urgência na tramitação do PL, que será votado direto no plenário, sem ar pelas comissões temáticas.

“Eu não vou fazer amizade com garimpeiro. Quero que você tire os garimpeiros de nossa terra. Eu não quero eles perto de nós!”, completa Luiz Yanomami  em seu recado a Lula, expressando ainda a sua indignação em relação à política ambiental do atual presidente, derrotado nas urnas, Jair Bolsonaro. “Ele matou os nossos parentes. Eu sinto muita raiva. Não quero a minha terra destruída!”, finaliza Luiz. A retirada completa de garimpeiros das Terras Indígenas Brasileiras foi uma das promessas de campanha de Lula.

Lula é esperança de mais saúde na Terra-floresta 624t3y

Aristeu Yanomami, em sua fala, além de também solicitar a retirada de todos os garimpeiros da TI, pede a atenção de Lula para a proteção do território demarcado – fundamental para o desenvolvimento das próximas gerações. “Eu fico preocupado porque aqui é a minha terra. Estão nascendo muitas crianças, por isso não quero os garimpeiros destruindo as nossas terras”, esclarece. Aristeu ainda solicita que médicos, enfermeiros e técnicos de saúde tenham melhores condições de trabalho para atuar no tratamento a seu povo. 

A malária explodiu em zonas de forte atuação garimpeira, como nas regiões do Uraricoera, Palimiu e Waikás. No Palimiu, em 2020, houve mais de 1.800 casos, segundo o relatório  divulgado pelo ISA. O documento ressalta que a população total do Palimiu, no mesmo ano, era de pouco mais de 900 pessoas – e que muitas delas foram, portanto, infectadas pela doença mais de uma vez. 

Em novembro de 2021, o Ministério Público Federal (MPF) de Roraima emitiu recomendação ao Ministério da Saúde, ao Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus), à Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) e ao Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei Yanomami) para que os órgãos pudessem reestruturar o atendimento à saúde aos povos da TIY. Apesar de ter recebido mais de R$ 190 milhões para assistência à saúde nos últimos dois anos, o território indígena registrou, de acordo com o órgão, piora acelerada dos indicadores de saúde.

Ainda segundo o levantamento produzido pelo MPF, a desnutrição atinge 52% das crianças de todo o território Yanomami. Nas comunidades mais isoladas, até 80% das crianças estão abaixo do peso, o que leva a TI a atingir índices muito superiores à média brasileira e piores do que em regiões como o Sul da Ásia e a África Subsaariana, onde se encontram os países com mais incidência de desnutrição infantil no mundo.

A falta de o a tratamento de saúde foi resultado da inércia do próprio governo federal. Com 37 polos-base, 78 Unidades Básicas de Saúde Indígena (UBSI) e uma Casa de Saúde Indígena (Casai Yanomami), por conta da dimensão de seu território, 98% desses centros de saúde são íveis exclusivamente por via aérea. Em 2020, o MPF já havia expedido recomendação para que a Sesai garantisse esse tipo de transporte para as equipes de saúde. Mas, desde 2019 não houve licitação para a prestação do serviço de transporte aéreo

O impedimento do atendimento médico com regularidade, a remoção de pacientes para atendimento em hospitais, o retorno de indígenas com alta médica, a troca de equipes de saúde, o abastecimento de remédios, o acompanhamento de crianças pela vigilância alimentar, o serviço de saneamento e a construção de estabelecimentos de saúde são as principais áreas afetadas pela negligência em relação ao transporte aéreo na TI. Quanto mais isolada a comunidade – e portanto mais vulnerável – menor a chance de contar com a presença de agentes de saúde. 

Em contrapartida, pistas de pouso clandestinas seguem servindo, no território, como base para o transporte ilegal de pessoas e todos os suprimentos necessários à expansão do garimpo ilegal.

Responsabilidade com a Terra-planeta i1d59

A fala do líder e xamã Yanomami Davi Kopenawa encerra o vídeo ao presidente eleito Lula. Kopenawa saúda o povo do planeta e lembra que seu povo está unido com as forças da natureza e da floresta. Por isso, afirma Kopenawa, estão todos muito contentes com a vitória de Lula nas eleições. “Nossas terras já foram roubadas, foram invadidas. Nós não queremos que continuem invadindo as nossas terras”, afirma, e completa lembrando que a demarcação da Terra Indígena Yanomami já ou por todos os processos legais até sua homologação, uma luta liderada, inclusive, por ele mesmo.

Davi Kopenawa Yanomami. Foto: Pedro J Márquez

Kopenawa explica que já conheceu o Lula pessoalmente e que acredita que ele é um homem honesto. Sua mensagem, porém, não se dirige apenas ao futuro chefe do executivo.“Eu quero mandar uma mensagem para todos os povos da Terra-planeta: nós estamos protegendo, nós queremos que a terra seja protegida, seja respeitada. A luta continua, para todos nós vivermos bem e em paz”, finaliza.

Veja o vídeo completo com as saudações e reivindicação dos líderes Yanomami a Lula.

  • Débora Pinto 203q12

    Jornalista pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, atua há vinte anos na produção e pesquisa de conteúdo colaborando e coordenando projetos digitais, em mídias impressas e na pesquisa audiovisual

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