O drone sobrevoava a floresta em busca do maior primata das Américas – o muriqui-do-norte – quando deparou-se com outro gigante, com um dossel que despontava, claramente acima das outras árvores ao redor. Pela câmera do drone, o pesquisador Fabiano Melo ficou intrigado com esse colosso e decidiu investigar. A descoberta foi surpreendente. Um jequitibá-rosa de impressionantes 65 metros e, simplesmente, a maior árvore viva conhecida da Mata Atlântica.
A árvore gigante resiste na Reserva Biológica da Mata Escura, na região do Vale do Jequitinhonha, norte de Minas Gerais. Com quase 51 mil hectares, a unidade de conservação criada em 2003 protege um raro remanescente de Mata Atlântica intocada.
Um refúgio que abriga sobreviventes da exploração madeireira que por séculos devorou árvores como este exemplar de jequitibá-rosa (Cariniana legalis). “Eu chuto que ela tem pelo menos uns 300 anos”, estima o pesquisador da Universidade Federal de Viçosa (UFV) Fabiano Melo, responsável pela descoberta.
O achado foi um completo acaso, já que o biólogo sobrevoava a floresta com um drone termal para identificar e monitorar grupos de muriquis-do-norte (Brachyteles hypoxanthus), espécie de macaco ameaçado de extinção que vive apenas na Mata Atlântica do sudeste.
A expedição faz parte do programa de monitoramento de fauna e flora realizado na Reserva Biológica da Mata Escura pelo ICMBio com recursos da Vale, por meio da iniciativa Meta Florestal.
“Conheço a área da Mata Escura há 25 anos, ajudei a criar a reserva, lá tem muitas árvores enormes, mas na hora que eu ei de drone por essa árvore me chamou muita atenção. Porque eu percebi que era uma árvore realmente muito grande, possivelmente um jequitibá. E pedi para a gestora da Rebio abrir uma trilha, porque eu queria medir e confirmar a altura”, conta Fabiano.
Aos pés do gigante e novamente com apoio do drone, foi confirmada a altura de 65 metros – maior que um prédio de 20 andares – e também o seu diâmetro de 5,5 metros.
Um porte inesperado para os jequitibás, que na medida em que envelhecem normalmente engrossam mais o tronco – com circunferências que facilmente ultraam seis metros – ao invés de espichá-lo. O crescimento para cima e não tanto para os lados, pode ter sido um recurso em busca de luz, acredita Fabiano, já que a árvore está localizada num vale que fica muito sombreado do meio da tarde adiante.
O novo registro desbanca o de outro jequitibá, documentado no município baiano de Ubatã, que até então detinha o título de árvore viva mais alta da Mata Atlântica, com 64 metros.
O botânico Ricardo Cardim, autor do livro “Remanescentes da Mata Atlântica: As grandes árvores da floresta original e seus vestígios” destaca que as características na Mata Escura são de uma floresta realmente primária e ancestral. “É uma árvore incrível e importantíssima e que retrata o que já foi a Mata Atlântica um dia no Brasil”, sentencia o botânico.
“Temos que lembrar dos 12,4% de remanescentes de Mata Atlântica acima de 3 hectares, raríssimos são os trechos que ainda conservam essa situação original, com as árvores seculares, isso é muito valioso”, acrescenta.
O botânico alerta ainda para a necessidade de investir em ações de restauração e conexão dos fragmentos remanescentes de Mata Atlântica para aumentar a resiliência da floresta – e de suas árvores seculares – às mudanças climáticas.
“É um monumento verde que precisa ser preservado, principalmente das mudanças climáticas regionais causadas hoje pela fragmentação da floresta, pelos desequilíbrios ecológicos, perda de fauna, mudanças de umidade, temperatura… Hoje tudo conspira contra essas árvores. E o único jeito de salvá-las é aumentando e reconectando os fragmentos”, ressalta Cardim.
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