Reportagens

Almirante Ibsen: uma vida dedicada ao Meio Ambiente 3c5y6y

Aos 90 anos, almirante Ibsen de Gusmão Câmara recebe homenagem do Ministério do Meio Ambiente por sua luta em prol da conservação.

Fabíola Ortiz ·
5 de dezembro de 2013 · 12 anos atrás

A Ministra e o Almirante. Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim - Divers for Sharks.
A Ministra e o Almirante. Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim – Divers for Sharks.

Rio de Janeiro — Nas mais de quatro décadas dedicadas à conservação da natureza, o Almirante Ibsen de Gusmão Câmara se tornou um dos decanos do ambientalismo brasileiro. Lúcido, ativo e crítico, aos 90 anos, Ibsen recebeu do Ministério do Meio Ambiente uma homenagem especial nesta quinta-feira, dia 5, por sua dedicação às causas ambientais.

O empenho de Ibsen ocorreu quando pouco se falava de meio ambiente no país. Ele liderou a campanha contra a caça de baleias no Brasil e também foi um grande defensor das Unidades de Conservação, com papel de destaque na criação de parques e reservas na Amazônia. Sua história foi contada por Marcos Sá Correa no livro “Água mole em pedra dura: dez histórias da luta pelo meio ambiente”, de 2006.

A participação de Ibsen foi fundamental também na criação de Unidades de Conservação marinhas, como a Reserva Biológica Atol das Rocas, em 1979, o primeiro Parque Nacional Marinho do país. Atuou também por Abrolhos, em 1983, e por Fernando de Noronha, criado em 1987.

Após entrar para a reserva, presidiu a Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza (FBCN), foi conselheiro por mais de 10 anos no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), além de contribuir para a criação de uma dezena de ONGs.

“Em um determinado ponto da minha vida comecei a perceber as barbaridades que eram feitas e isso me levou cada vez mais a me envolver [com o meio ambiente]. Mantenho meu interesse até hoje, estudo todos os dias e acompanho as revistas científicas. Quero estar em dia com o que está acontecendo. Me assusto demais pelo que está havendo no mundo em termos de destruição da vida. Estamos ando por uma das crises ambientais e biológicas mais séries e intensas dos últimos 65 milhões de anos. A humanidade não está percebendo o que está fazendo”, disse durante o encontro desta quinta.

Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim - Divers for Sharks.
Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim – Divers for Sharks.
“Eu fiz o que pude, não fiz o que quis, mas o que pude e espero ter dado alguma contribuição. Feliz por saber que há pessoas que apreciam alguma coisa que eu fiz. A juventude é a esperança das coisas melhorarem”, afirmou o almirante em conversa com ((o))eco. “Posso dizer que metade da minha vida, me dediquei à causa ambiental. A minha vocação ambientalista foi porque eu gostava de natureza. Na Marinha, eu colaborava dentro das possibilidades, me dediquei integralmente a partir de 1981, quando me aposentei”, contou.

Ibsen aproveitou a homenagem para renovar o compromisso com a causa: “Se a sorte me permitir, continuarei colaborando com o conservacionismo. Pretendo até os últimos dias da minha vida continuar na conservação”.

Testemunha da história

Como militar da Marinha, Ibsen comandou uma flotilha de navios no rio Amazonas e realizou patrulhas ao longo de todo o rio e pelos seus afluentes. O então jovem oficial se deparou com um avançado nível de desmatamento nas áreas por onde navegou. Desde então, ou a manter contato com organizações conservacionistas. Naquela época, na década de 40, pouco se sabia do desastre ambiental que o homem estava ocasionando.

Ibsen acompanhou a trajetória do movimento ambientalista e da política ambiental no Brasil. Em balanço, afirmou existir uma maioria interessada na preservação ambiental, mas que mesmo assim a destruição aumentou. “As pessoas tomam consciência que estamos fazendo uma devastação, mas nossa força não é suficiente para represar isso. Comparando na época quando comecei, o número de pessoas interessadas é infinitamente maior”.

Embora considere que o Brasil “avançou bem” dentro do cenário mundial, não poupa críticas ao chamado desenvolvimento sustentável. Na sua opinião, desenvolvimento e sustentabilidade ainda são incompatíveis. “Uso sustentável para mim é brincadeira, nada mais é que refrear um pouco o ritmo de destruição. Isso não satisfaz”.

Para Ibsen, sem as atuais Unidades de Conservação, “não iria sobrar nada” para conservar no país. Por isso, defende que o Brasil precisa criar ainda mais áreas protegidas, mesmo reconhecendo a dificuldade de resguardá-las e proteger a sua biodiversidade. Sem contar a “pressão violenta” do setor agrícola contra a conservação.

Mais UCs marinhas

A criação de mais unidades costeiras e marinhas ainda é motivo de preocupação. “São pouquíssimas, isso é um problema mundial. Essa é uma área que precisamos avançar muito”, disse Ibsen. Enquanto no mundo há pouco mais de 3% das áreas marinhas nacionais protegidas, o Brasil tem cerca de 1%.

A iminente exploração em larga escala do petróleo na camada pré-sal também é motivo o alarma: “Meu grande receio é que haja um vazamento na camada pré-sal e seja incontrolável. No Golfo do México a 1.500 metros de profundidade, levou-se muito tempo para controlar. Nós vamos conseguir controlar a 7 mil metros? Tenho receio disso. É preciso o máximo de cautela”.

Um ambientalista no poder

Na opinião do secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Roberto Cavalcanti, Ibsen soube se utilizar de um trunfo: ele transitava muito bem nas esferas de poder e de tomada de decisão.

“Pelas características do governo na época e pela sua formação, o almirante Ibsen tinha e tem um o que pouquíssimos ambientalistas tinham, além de uma grande credibilidade e ter estudado intensamente o assunto. Foi um momento essencial, uma época que as universidades brasileiras estavam começando a oferecer cursos na área de ecologia”, disse Cavalcanti. “Ibsen foi capaz de trazer questões ambientais para o centro do governo”.

Sua carreira de militar ocorreu, em boa parte, durante o período a ditadura.  De 1974 a 1979, no governo de Ernesto Geisel, ocupou o cargo de vice-chefe do Estado Maior das Forças Armadas. Isso não impediu que ele obtivesse a iração até de ambientalistas de esquerda.

Após quatro décadas de militância ambiental, ele continua sendo carinhosamente chamado de “Almirante”.

Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim - Divers for Sharks.
Cortesia /Paulo Guilherme Pingüim – Divers for Sharks.

 

 

Leia Também
Do mar se vê mais longe – com Ibsen Gusmão Câmara
O Homem e o Mar: desafios da conservação dos oceanos
O Almirante verde

 

 

 

  • Fabíola Ortiz 381p72

    Jornalista e historiadora. Nascida no Rio, cobre temas de desenvolvimento sustentável. Radicada na Alemanha.

Leia também 84q8

Análises
13 de junho de 2025

O falso herói dos mares: por que o GNL ameaça os oceanos e o futuro do Brasil? 2r3i3f

O Brasil tem demonstrado interesse em investir em navios movidos a gás natural liquefeito, o que contraria as projeções alinhadas com o Acordo de Paris

Salada Verde
13 de junho de 2025

Deputado do PL é novo relator do Projeto de Lei do Licenciamento e4v37

O ruralista Zé Vitor, que relatará a proposta no Plenário, votou a favor da primeira versão do PL que ou na Câmara e em de outras 4 propostas que flexibilizam o meio ambiente

Reportagens
13 de junho de 2025

Declínio de animais dispersores de sementes dificulta combate às mudanças climáticas 1x5v

Equipe internacional de pesquisadores faz alerta global para necessidade de incluir frugívoros nas estratégias de conservação, recuperação florestal e mitigação das alterações do clima

Mais de ((o))eco 6q6w3q

conservação 4y3hz

Análises

O falso herói dos mares: por que o GNL ameaça os oceanos e o futuro do Brasil? 2r3i3f

Reportagens

Declínio de animais dispersores de sementes dificulta combate às mudanças climáticas 1x5v

Salada Verde

PL que institui programa nacional de recuperação da Caatinga avança na Câmara 1w1c

Notícias

Brasileiros estão mais cientes da importância dos oceanos, mas agem pouco 6q5j5

mma 4j4b37

Reportagens

Orçamento para meio ambiente é 11 vezes menor que recurso destinado a emendas parlamentares 4e5v3g

Salada Verde

Vida selvagem e meta para zerar desmatamento são prejudicadas por ataques às unidades de conservação 5k5y3i

Salada Verde

Consulta para plano de prevenção da Mata Atlântica termina na próxima segunda 6762v

Salada Verde

Em entrevista, Marina Silva fala sobre recuperar legislação ambiental 26x3e

política 1x55f

Notícias

Ilegalidade atinge ao menos 58% do comércio de mercúrio no Brasil, mostra estudo 4l1u32

Reportagens

ados oito meses de governo, Lula ainda não decidiu se Brasil vai entrar na OCDE 426my

Notícias

Cai superintendente do Amazonas que pediu investigação contra Salles 325l1p

Salada Verde

Governo estuda a criação de um Ministério da Amazônia para acolher Pazuello 6v2q4d

clima e energia 4k2q1l

Notícias

Não cabe ao MMA definir o caminho da política energética brasileira, diz Marina Silva 1v3u43

Colunas

Nordeste Brasileiro: A Região esquecida no centro do debate climático 2p1x33

Colunas

Os desafios da diplomacia climática em 2025 3r3y3h

Reportagens

Congresso aprova marco da eólica offshore com incentivo ao carvão   6m6n3w

Deixe uma respostaCancelar resposta 4wh1i

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.