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Primeiro registro fotográfico do desenvolvimento de ninhegos de tapaculo-de-colarinho 221a1o

(Melanopareia torquata) (Aves: Melanopareiidae) Texto: Mieko Ferreira Kanegae1 e Marina Telles Marques da Silva2 Imagens: Rodrigo Z....

Mieko Ferreira Kanegae · Marina Telles Marques da Silva ·
3 de julho de 2008 · 17 anos atrás

(Melanopareia torquata) (Aves: Melanopareiidae)

Texto: Mieko Ferreira Kanegae1 e Marina Telles Marques da Silva2

Imagens: Rodrigo Z. Damiano3

O Tapaculo-de-colarinho (Melanopareia torquata) é uma ave endêmica do Cerrado (Silva e Bates 2002), ou seja, é exclusiva deste bioma. Ocorre no sul do Pará, Piauí, Bahia, Goiás, Mato Grosso e São Paulo à Bolívia e extremo nordeste do Paraguai (Ridgely e Tudor 1994; Sick 1997). Essa espécie encontra-se na Lista dos Animais Ameaçados de Extinção no Estado de São Paulo (Decreto 42.838 de 04 de fevereiro de 1998) na categoria “em perigo”. Inicialmente a espécie foi classificada como Furnariidae, depois como Formicariidae (Schauensee 1966, 1970) e mais recentemente como Rhinocryptidae. Atualmente é classificada na família Melanopareiidae, na qual é a única espécie da família que ocorre no Brasil.

Habita os campos cerrados, savanas ricas em cupinzeiros e campos sujos, sendo maior a população nos cerrados ralos que nos campos sujos (Sick 1997). Não é muito comum nos campos limpos (Ridley e Tudor 1994). Parece existir variação de comportamento em relação à sensibilidade às alterações do ambiente. Tubelis e Cavalcanti (2000) encontraram diferença na abundância da espécie em áreas de cerrado preservado e alterado. Contudo Davis (1993), na Bolívia, não encontrou diferença e considerou a espécie como ‘quase comum’ na região. De acordo com Stotz et al. (1996), M. torquata tem sensibilidade média a distúrbios provocados pelo homem.

M. torquata é um eriforme com 14 cm (Sick 1997) e peso de 15,89 ± 1,17 g. Alimenta-se principalmente de pequenos insetos que busca no solo (Sick 1997). Os indivíduos cantam durante todos os meses do ano (Sick 1997), sendo mais fácil ouvi-los do que vê-los (Ridley e Tudor 1994). Muitas vezes nos deparamos com um indivíduo cantando na nossa frente, mas não conseguimos detectá-lo visualmente. Isso ocorre porque a espécie vocaliza no meio ou no alto de arbustos, se deslocando muito pouco. Além disso, sua coloração faz com que seja confundida com a vegetação, o que dificulta a sua detecção. Cantam geralmente uma série de “chip” constante que soa de forma ressonante e alta. Eventualmente, podem emitir um penetrante “churr” (Krabbe e Schulenberg 2003), que parece estar relacionado com a defesa do ninho e/ou comunicação com os filhotes (obs. pess).

Até recentemente pouco se sabia a respeito da reprodução da espécie. Sick (1997) faz apenas um breve comentário do ovo que se apresenta finamente salpicado no pólo rombo. Houve um registro reprodutivo de uma fêmea com ovos no mês de novembro na Bolívia (Davis 1993). Em 20 de outubro de 2006 foi encontrado o primeiro registro do ninho em uma área de Cerrado na Estação Ecológica de Águas Emendadas, Distrito Federal (Gressler e Marini, no prelo). De acordo com a classificação de Simon e Pacheco (2005) o ninho é fechado e globular e foi disposto em uma moita de gramínea do cerrado sensu stricto. O ovo foi chocado por 15 a 18 dias, mas não houve acompanhamento do filhote que foi predado no início do seu desenvolvimento.

Na Estação Ecológica de Itirapina, localizada a 230 km de São Paulo, encontramos dois ninhos de M. torquata que foram acompanhados até os filhotes abandonarem o ninho. O primeiro ninho foi encontrado em uma área de ‘campo sujo’ no dia 12 de novembro de 2007 com dois filhotes bem pequenos. O segundo foi descoberto no dia 19 de novembro de 2007 com dois ovos em área de ‘campo cerrado’. Apenas um dos ovos eclodiu no dia 29 de novembro. Os filhotes demoraram entre 12 e 13 dias para abandonarem o ninho. Ambos os ninhos foram construídos em moita de gramíneas, como em Gressler e Marini (no prelo). Seguem algumas imagens do ovo, filhote e do ninho.

Interessante notar que os ninhos são difíceis de serem encontrados, pois são construídos em meio às gramíneas nativas do Cerrado, bem próximos do chão. Essa localização dos ninhos faz com que sejam altamente vulneráveis ao pisoteio por pessoas e animais. Uma cena comumente observada é a pastagem de gado dentro de áreas do Cerrado. Aparentemente essa imagem pode ser “inofensiva”, contudo o seu impacto é grande tanto para a comunidade de plantas, como para a de animais que habitam o sub-bosque. As conseqüências observadas se iniciam com a diminuição da densidade de gramíneas e arbustos que se soma ao pisoteio intenso da área. Com as gramíneas nativas mais ralas, as espécies exóticas como o capim-braquiária (Brachiaria spp.) e o capim gordura () apresentam maior facilidade de expansão. Nessas áreas, M. torquata, assim como muitas espécies de sub-bosque desaparecem devido a relativa sensibilidade a alteração do hábitat. Portanto, devemos ter em mente que cada espécie possui o seu microhábitat com aqueles recursos e condições que são necessários a sua sobrevivência e reprodução. Dependendo da sua sensibilidade e do nível de distúrbios nas áreas onde vivem as espécies podem desaparecer a nível local.

Para captação inédita das imagens, o fotógrafo Rodrigo Z. Damiano demorou semanas, submetido a chuvas, insetos e condições desfavoráveis. Foi utilizado larga obtenção de equipamentos, tais como, telemetria, GPS, playback e lentes de grande alcance, acha visto que é uma ave pequena e de difícil aparição. Mas todo esforço é recompensado pelas imagens nunca registrado por outras lentes.

Referências Bibliográficas:

Davis, S. E. Seasonal status, relative abundance, and behavior of the birds of Concepción, Departamento Santa Cruz, Bolívia. Fieldiana Zoology, v. 71, p. 1-33, 1993.

GRESSLER, D. R. e M. Â. MARINI. Nest, eggs and nestling of the Collared Crescentchest Melanopareia torquata in the Cerrado region, Brazil. no prelo.

Krabbe, N. e T. S. Schulenberg. Family Rhinocryptidae (tapaculos) Pp. 748–787 In: del Hoyo, J., A. Elliott e D. A. Christie. (eds.) Handbook of the birds of the world, vol. 8. Lynx Edicions, Barcelona. 2003.

MARINI, M. Â., J. C. MOTTA-JÚNIOR, L. A. S. VASCONCELLOS e R. B. CAVALCANTI. Avian body masses from the cerrado region of central Brazil. Ornitologia Neotropical 8: 93-99. 1997.

RIDGELY, R. S. e G. TUDOR. The Birds of South America – The Suboscine erine. Oxford University Pess, Oxord, v. 2, 1994.

Schauensee, M. The species of birds of south America with their distribution. Narberth, Pa. Livingston Publising Co, 1966.

Schauensee, M. A guide to the Birds of south America. Wynnewood, Pa. Livingston Publishing Co, 1970.

Sick, H. Ornitologia Brasileira. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1997.

Silva, J. M. C. e J. M. Bates. Biogeographic patterns and conservation in the South American Cerrado: A tropical savanna Hotspot. BioScience, v. 52, p. 225-233, 2002.

SIMON, J. E. e S. PACHECO. On the standardization of nest descriptions of neotropical birds. Revista Brasileira de Ornitologia 13: 143-154. 2005.

STOTZ, D. F., J. W. FITZPATRICK, T. PARKER III e D. K. MOSKOVITS. Neotropical birds: Ecology and Conservation. University of Chicago Press, Chicago, 1996.

TUBELIS, D. P. e R. B. CAVALCANTI. A comparison of bird communities in natural and disturbed non-wetland open habitats in the Cerrado’s central region, Brazil. Bird Conservation International, v. 10, p. 331-350, 2000.

1 Pós-Graduação em Ecologia, Instituto de Biociências, Departamento de Ecologia, Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected]

2 Pós Graduação em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São Carlos.

3 Fotógrafo Profissional de Natureza. www.brazilnaturephoto.com

  • Mieko Ferreira Kanegae 4k5l1a

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