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Legalidade de megadesmates no Pantanal avança para julgamento no STJ 2o3q1t

Fontes jurídicas esperam que a decisão reitere o reforço na proteção do bioma promovido pela nova legislação do Mato Grosso do Sul

Aldem Bourscheit ·
26 de maio de 2025

A legalidade de licenças para megadesmates no Pantanal sul-mato-grossense pode ser avaliada em breve no Supremo Tribunal de Justiça (STJ). As permissões foram amparadas num decreto estadual de 2015 que, apontaram investigações, foi baseado em estudo pago pela Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul). 

No topo da lista de julgamentos está um processo tratando de 20,5 mil ha devastados em uma única fazenda, em Corumbá. A área equivale a quase 29 mil campos oficiais de futebol. O caso está pronto para uma decisão, mostra o sistema do tribunal.

Esse licenciamento chegou a ser derrubado por uma liminar concedida em ação do Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MPMS). Contudo, a decisão foi revertida pelo Tribunal Estadual de Justiça, após recurso do próprio governo sul-mato-grossense.

O processo em pauta no STJ é parte de quatro ações do Ministério Público estadual contra licenças para desmatamentos baseadas no mesmo decreto. As autorizações somam quase 47 mil ha, similares a um terço do território da capital São Paulo (SP). 

Diante disso, qual será o destino de tanto desmate? Fontes jurídicas avaliaram a ((o))eco que o que for decidido para o primeiro caso deve repercutir nas demais ações. Ou seja, se uma permissão for invalidada ou legitimada, as demais tendem a ter o mesmo destino.

“O que se discute é que permitir a supressão vegetal (…) sem estudos técnicos corretos e suficientes desconsidera-se aquela área como de preservação, bem como (…) não se está preservando a pecuária de tradição do Pantanal (…), mas sim implementando um sistema exógeno de exploração da terra incompatível com a fragilidade do Pantanal”, destaca o MPMS em petição.

Além disso, as mesmas fontes não descartaram à reportagem a possibilidade de que, caso o STJ decrete uma decisão judicial favorável à conservação do Pantanal, os donos ou ocupantes das fazendas sejam obrigados a restaurar os estragos ambientais que cometeram.

Contudo, a devastação pode ser bem maior do que se estima. Informações do governo estadual dão conta de que, só entre meados de agosto de 2019 a 14 de abril de 2023, foram permitidas intervenções em 194 mil ha de vegetação em fazendas pantaneiras, ou cerca de 2% da área estadual do bioma.

A criação de gado é o principal destino dos desmatamentos no Pantanal. Foto: Ednilson Aguiar / Greenpeace

Novo regramento 1s498

Questionado pela reportagem, o diretor-executivo do Instituto SOS Pantanal, Leonardo Gomes, espera que a decisão do Tribunal Superior observe que a proteção do Pantanal é reforçada na legislação do Mato Grosso do Sul desde os estragos gerados pelo decreto de 2015. “Esse regramento mais robusto deve pesar na revisão dos licenciamentos”, destacou.

Sancionada em dezembro de 2023, a nova lei estadual pantaneira exige licenças criteriosas para desmates a partir de 500 ha e barra ações que mudem o sobe-e-desce natural das águas do bioma, como drenos e barragens, na porção mais baixa da planície alagável.

As regras igualmente bloqueiam a expansão de pastagens exóticas, carvoarias, soja, cana e eucalipto. Ao mesmo tempo, protegem mais as veredas, promovem o combate a incêndios, abrem alas à restauração ambiental e à formação de corredores ecológicos.

Como noticiado por ((o))eco, a legislação foi debatida e aprovada em menos de quatro meses, diante das explosivas taxas de destruição do Pantanal e da ameaça de suspensão das licenças estaduais para desmate, pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). 

Nove em cada dez ha de vegetação pantaneira eliminada desde 2019 estavam no Mato Grosso do Sul, mostrou um balanço do MapBiomas. Além disso, as perdas no primeiro semestre de 2023 foram três vezes maiores do que o observado no mesmo período do ano anterior. 

O desabalado desmatamento, calçado inclusive nas licenças baseadas no decreto de 2015, fizeram o atual governador Eduardo Riedel (PSDB) suspender para reavaliação todas as licenças para suprimir vegetação nativa do Pantanal, em agosto de 2023, antecipando uma inevitável decisão do Conama.

O Pantanal é um dos grandes abrigos mundiais de vida selvagem, como a majestosa onça-pintada (Panthera onca). Foto: Carlos Eduardo Fragoso / Greenpeace

Insuspeito estudo 1d6q48

O inquérito do Ministério Público que investiga a devastação no Pantanal do Mato Grosso do Sul apontou que o estudo base do decreto de 2015 foi financiado por uma federação agropecuária estadual por R$ 94,2 mil. O trabalho foi contratado após a Embrapa Pantanal afirmar que no máximo 35% dos imóveis rurais poderiam ser desmatados. Já o estudo encomendado permitia que fazendas eliminassem até 60% da vegetação nativa. A elaboração do documento foi coordenada por um professor associado da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP). A instituição não endossou o estudo.

À época, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul ressaltou que o trabalho não era “oficial” e jamais deveria ser usado para fundamentar uma legislação ambiental, como fez o governo Reinaldo Azambuja (PSDB). A norma também foi questionada pela Controladoria (CGU) e Advocacia (AGU) gerais da União, que pediram medidas para que as normas que protegem o meio ambiente fossem realmente cumpridas no estado do Centro-Oeste.

O STJ é a instância máxima do Judiciário brasileiro para decisões que não envolvam temas constitucionais. O Ministério Público (MPMS) afirmou que “aguardará o julgamento do recurso para, se necessário, avaliar a conveniência de nova manifestação”. O Governo do Mato Grosso do Sul não se pronunciou até o fechamento da reportagem.

  • Aldem Bourscheit 2tg

    Jornalista cobrindo há mais de duas décadas temas como Conservação da Natureza, Crimes contra a Vida Selvagem, Ciência, Agron...

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