Trazer a justiça climática para a prática a pelo desenvolvimento de estratégias e soluções que envolvam o território. Esse olho territorial é mobilizado principalmente pela juventude, que vive as questões da crise climática na pele enquanto procura enxergar futuros possíveis. É o que trouxe a cientista ambiental e integrante da Rede Favela Sustentável (RFS) Gisele Moura durante o IV Fórum Terra 2030. Realizado na última quarta-feira (21), no Rio de Janeiro, o evento teve como foco o protagonismo da juventude no enfrentamento da crise climática.
Com foco em justiça climática a partir do potencial das favelas como modelos de comunidades sustentáveis, a Rede Favela Sustentável (RFS) é formada por 994 integrantes, mobilizadores comunitários de mais de 300 favelas e aliados técnicos. Apesar de não ser formada apenas por jovens, eles estão cada vez mais presentes nas mobilizações, debates e articulações do grupo, segundo Gisele, que é coordenadora de gestão no projeto de Justiça Climática da RFS. O objetivo principal da Rede é impulsionar e concretizar ações e práticas já existentes nas favelas como exemplos de modelos e soluções a serem seguidas.
Dados que direcionam iniciativas 5e4t1l
A cientista explica que a juventude ativista e engajada num geral, não apenas dentro da Rede, vem protagonizando soluções voltadas principalmente para geração cidadã de dados e ‘advocacy’. Relatórios como o “Justiça Hídrica e Energética nas Favelas: Levantando Dados, Evidenciando a Desigualdade e Convocando para Ação”, desenvolvido por 30 jovens e 15 mobilizadores adultos da Rede Favela Sustentável, e o “Vozes da juventude: energia como direito humano e bem essencial”, do Instituto Pólis, são exemplos práticos desse movimento. Além disso, instituições como Casa Fluminense, Instituto Decodifica e DataLab também atuam com bases de dados que trabalham desde o clima até saúde, segurança e gênero.
É por causa dessa variedade de iniciativas e movimentos que o poder da coletividade se torna ainda mais importante, principalmente quando se trata de justiça climática. Gisele explica que o trabalho em conjunto é necessário do ponto de vista da força de articulação. Para ela, o coletivo se faz necessário para que as vozes dos jovens – sobretudo periféricos – sejam ouvidas, respeitadas e levadas em consideração. “Uma ação local, territorializada, que vem da ação dos jovens, às vezes pode chegar a uma pauta nacional, podendo mudar políticas nacionais do ponto de vista de periferias, das favelas. Então, a Rede articulada possibilita que isso não se perca no caminho. Por exemplo: no início, é apenas pesquisar dados da favela, mas daí a gente vê que consegue dialogar com uma política nacional, que pode mudar a vida de todo mundo”, destacou.
Para além da coletividade, o trabalho da juventude traz como um de seus maiores impactos, na visão da cientista, a expansão de narrativas para o debate. Ainda que visões políticas, teóricas e acadêmicas sejam importantes, a atuação dos jovens traz um olhar mais ampliado e territorializado para o debate. “Isso parte de trazer dados e elucidar verdades que antes não eram ditas. Antes, ninguém queria saber como era água e luz na favela ou como os jovens viam a questão de segurança pública, por exemplo”, aponta a pesquisadora. Questões que, segundo ela, se relacionam com clima, meio ambiente, sociedade e gênero e que, pensadas em conjunto, geram políticas públicas necessárias ao cotidiano territorial.
Soluções que surgem dos territórios 3t1n3q
Em sua fala no Fórum Terra 2030, Gisele citou a frase de Ailton Krenak para ilustrar a discussão: “Acho que a juventude traz essa força que é pensar em outros futuros possíveis”. Os jovens trazem um saber que não está na academia ou nos espaços de poder, mas sim nas ruas, nas favelas e nas vivências. Esse olhar para o território permite que estratégias e soluções mais direcionadas aos problemas sociais sejam elaboradas, o que já vem sendo feito por diversas iniciativas, como mostram o Mapa da Rede Favela Sustentável e o Guia para Justiça Climática, desenvolvido pela Casa Fluminense.
Na avaliação da cientista, contudo, o movimento da juventude ainda é muito atrelado pela sociedade em geral ao campo do ativismo e da militância. Em eventos e discussões, como a COP, “o espaço da juventude não pode ser só de representatividade, ele precisa ser transversal”, reivindica. Além disso, quando se trata do olhar mais amplo para as questões climáticas, a cientista argumenta que o foco ainda está muito nos problemas e nas consequências que eles geram, e pouco nas soluções – muitas que já foram pensadas e desenvolvidas territorialmente. “Eu acho que existe um discurso que é muito injusto e que não cabe mais que é: ‘por falta de tecnologia, de dinheiro ou de vontade política alguma coisa não acontece’. Problema esse que às vezes as pessoas ali do território já resolveram, do jeito delas, mas já resolveram”, citou. “Então eu acho que a gente tem que parar de ver essas coisas que nos assolam e enxergar nesse lugar de solução mesmo. Eu quero sair desse lugar de uma jovem ativista para uma jovem que soluciona problemas de fato”, completou.
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