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Envolver comunidades é desafio do manejo f4y1t

Com maior apoio do governo, projetos de exploração florestal na Amazônia podem ser gerenciados por comunidades extrativistas.

Nathália Clark ·
28 de abril de 2011 · 14 anos atrás
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Parintins (AM) – Na Amazônia, de acordo com dados recentes do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), são retirados 11 milhões de metros cúbicos de madeira ao ano. Deste total, 8,8 milhões são fruto de extração ilegal. Para reverter este cenário, o governo pretende incentivar o  manejo florestal comunitário e familiar, apostando que este pode ser um modelo para barrar de vez o desmatamento.

Ainda não existem dados oficiais sobre geração de renda para o manejo florestal em escala comunitária, mas o pesquisador Paulo Amaral, do Imazon, estima que 1,5 milhão de pessoas dependem hoje do extrativismo. Estes produtores, que retiram não só madeira, mas também produtos nativos como o açaí, o babaçu, a castanha, a andiroba, a copaíba, buscam regularizar sua produção para fazer frente à atividade ilegal.

Em 2009, o Governo Federal instituiu o Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar (PMCF) para organizar ações de gestão e fomento. Hoje, 800 mil hectares são utilizados na Amazônia para a prática econômica do manejo, movimentando anualmente uma renda de mais de R$ 10 milhões somente em assentamentos e Reservas Extrativistas (Resex), de acordo com levantamentos do Serviço Florestal Brasileiro (SFB).

Encontro em Parintins.
Encontro em Parintins.
Entretanto, muitas associações ainda sofrem para conseguir legalizar suas atividades e para ter o a mercados. Reunidos no “Grande Encontro em Defesa da Floresta, dos Povos e da Produção Sustentável”, realizado em Parintins-AM nos dias 15 e 16 de abril, cerca de 700 pessoas, entre líderes de associações comunitárias, especialistas, ONGs e representantes do governo, discutiram os desafios para a produção.

O evento foi realizado pelo Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e Fórum Amazônia Sustentável, que preparam um documento com as principais demandas, a ser entregue à ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Também presente no encontro, a ministra defendeu maior participação do manejo na economia nacional. “Não tem sentido um país com a maior extensão de florestas tropicais do planeta ter apenas 4% da participação do PIB de produtos florestais no mundo”.

Desafios para produção

Corte da sapupema - curso de corte direcionado - Comunidade do Aninga (foto: divulgação)
Corte da sapupema – curso de corte direcionado – Comunidade do Aninga (foto: divulgação)
Os principais problemas enfrentados pelas comunidades dizem respeito à regularização fundiária, ao crédito e incentivos à produção, assistência e capacitação técnica.

Para conseguir o plano de manejo, as associações precisam ter conhecimento técnico e ter o título de propriedade de sua terra devidamente regularizado. Edgar Lima da Silva, da Associação dos Moveleiros de Parintins (Amopin), destacou que a falta de regularização leva ao desperdício de 50% da madeira. “Com medo de ser pego, o extrator tira só o centro da madeira, deixando o resto sem aproveitamento”, afirmou.

Outra questão levantada foi a burocratização dos processos. Muitas vezes, os produtores não têm conhecimento das leis que regem suas atividades, e tampouco compreendem os documentos que precisam apresentar para comprová-las. Por isso, foi visto como fundamental um tratamento diferenciado para os pequenos produtores.

Paulo Adario, coordenador da campanha Amazônia do Greenpeace, defendeu o incentivo ao crescimento da produção com aumento de área e de recursos. “Queremos mais unidades de conservação de uso sustentável, mas, sobretudo, queremos incentivos, um sistema de crédito florestal similar ao sistema de crédito rural”.

Segundo a engenheira florestal do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Patrícia Gomes, “é mais fácil conseguir recurso para desmatar do que para fazer manejo, quando este é um fator de contenção do desmate”.

O diretor geral do Serviço Florestal Brasileiro, Antônio Carlos Hummel, afirmou que todo o investimento hoje está voltado para as áreas que já foram alteradas, não para a floresta que ainda está em pé: “a estrutura dos órgãos do estado priorizam a agropecuária que já está em curso, e isso tem que ser transferido para a riqueza que temos de floresta”.

Para além dos percalços burocráticos

As iniciativas que prosperam ainda são escassas e isoladas, mas as estatísticas estão em crescimento. Segundo Paulo Amaral, na década de 90 havia 200 planos de manejo na Amazônia; em 2010 já existiam cerca de 1500. O Acre aparece como o estado com maior concentração de experiências que dão certo, onde existem atualmente 39 iniciativas de manejo comunitário, das quais cinco são de extração de madeira.

Iniciativas de Manejo Florestal Comunitário e Familiar identificadas em seis estados amazônicos em 2009/2010 referentes a produção de madeira e de produtos florestais não-madeireiros (PFNMs)
Iniciativas de Manejo Florestal Comunitário e Familiar identificadas em seis estados amazônicos em 2009/2010 referentes a produção de madeira e de produtos florestais não-madeireiros (PFNMs)
“Existem experiências bem-sucedidas, e elas precisam ser replicadas”, disse. Um exemplo citado por ele foi o Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes, conhecido popularmente como Cachoeira, no município de Xapuri, no Acre, que produz principalmente castanha-do-brasil e borracha.

Hummel apontou como outros exemplos o caso do Projeto Ambé, na Floresta Nacional do Tapajós, e o Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) de Anapu; ambos no Pará. De acordo com o diretor, o Projeto Ambé já possui plano de manejo para os seus 200 mil hectares, e arrecada R$ 2,5 milhões por ano com comercialização de madeira. O Serviço Florestal Brasileiro oferece assistência para capacitação da população no manejo.

“O projeto no Tapajós, que produz principalmente toras de madeira, já pode começar a pensar em se industrializar, virar serraria”, afirmou Hummel. Atualmente, o projeto possui cerca de 90 manejadores, homens e mulheres representantes de mais de 20 comunidades. Essas pessoas atuam diretamente nas imediações da base da Flona, à margem da BR-163.

Segundo Cirlene de Jesus, presidente da Associação Virola Jatobá, do PDS de Anapu, somente até abril de 2011 já foram extraídos 10 mil m³ de madeira, o equivalente a R$ 722 mil. Deste total, 50% é revertido em investimentos para a própria associação e na compra de
equipamentos.

Promessas do governo
 

Isabella Teixeira
Isabella Teixeira
Izabella Teixeira firmou o compromisso público de levar às demais instâncias do Governo as demandas e recomendações das comunidades, às quais chamou de “parte da construção de qualquer política pública de meio ambiente e de um mundo sustentável”.

No plano de ação para o manejo florestal comunitário de 2011, documento ainda não divulgado oficialmente, o governo estima investimentos da ordem de R$ 32,7 milhões só no bioma Amazônia.

A ministra informou ainda que foi colocada em consulta pública pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a Instrução Normativa (IN) que trará as novas regras para aprovação dos planos de manejo comunitários, cujo foco é a exploração de recursos madeireiros no interior das UCs federais das categorias Reserva Extrativista, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Floresta Nacional. Segundo ela, a previsão é de que a regulamentação esteja pronta em junho.

Bolsa florestal para pequenos produtores

Uma bolsa de negócios para pequenos produtores florestais organizados (cooperativas, associações, etc.) está sendo desenvolvida em parceria pelos Departamentos de Engenharia da Computação e de Ciências Florestais da Universidade de São Paulo (USP/Esalq).

O projeto tem como objetivo desenvolver um sistema piloto de comunicação, visando a inclusão desses produtores no mercado mais amplo e competitivo. A plataforma oferecerá subsídios e ferramentas para a promoção de oportunidades de compra e venda, e facilitará o o de empresas, instituições e pessoas físicas aos produtos da economia florestal comunitária.

Este modelo de bolsa-piloto já foi implantado com sucesso na Índia e África, e, segundo a professora Adriana Nolasco, uma das coordenadoras do projeto, deve começar a ser testado a partir de maio em dois municípios da Amazônia.

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  • Nathália Clark 6n6u6l

    Nathalia Clark é jornalista na área de meio ambiente, desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas, justiça social e direitos humanos.

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