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Mais de 3 milhões de hectares já queimaram em áreas protegidas no Cerrado em 2020 4o195p

Monitoramento feito pelo LASA/UFRJ levanta os dados da extensão de queimadas dentro de unidades de conservação e Terras Indígenas no Cerrado neste ano

Duda Menegassi ·
15 de outubro de 2020 · 5 anos atrás
Áreas protegidas do Cerrado já tiveram mais de 3 milhões de hectares queimados apenas em 2020. Foto: Semad-GO/Divulgação

Uma área maior que o estado de Alagoas já queimou dentro de áreas protegidas inseridas no Cerrado em 2020. São mais de 3 milhões de hectares atingidos pelo fogo dentro de unidades de conservação e Terras Indígenas, entre 1º de janeiro e 13 de outubro deste ano. Os dados são do sistema ALARMES, monitoramento realizado pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (LASA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em áreas menores, como o Monumento Natural Estadual Lapa Nova de Vazante, em Minas Gerais, o fogo já afetou 95% da unidade de conservação.

No topo da lista estão as Terras Indígenas (TI). Sete das dez áreas protegidas do Cerrado que mais queimaram são territórios indígenas. A Terra Indígena Parque do Araguaia, no Tocantins, é a que mais queimou, com 483 mil hectares afetados por incêndios, o equivalente a 36% do território. A TI é habitada pelos povos Avá-Canoeiro, Iny Karajá, Javaé e Tapirapé.

Atrás da Terra Indígena no ranking do fogo está um dos seus vizinhos, o Parque Nacional do Araguaia, onde 171 mil hectares já queimaram, o equivalente a 31% da área protegida. Em terceiro está a TI Parabubure (onde vivem os Xavantes), no Mato Grosso, com 163 mil hectares atingidos pelo fogo, 72% do território.

As dez áreas protegidas do Cerrado que mais queimaram entre 1º de janeiro e 13 de outubro. Fonte: Sistema ALARMES/LASA

Unidade de conservação emblemática do Cerrado, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, teve 23 mil hectares de atingidos pelo fogo, o que corresponde a 9% do parque. No Parque Nacional da Serra do Cipó, em Minas Gerais, as queimadas já consumiram 16 mil hectares, o que representa metade da área total do parque.

O monitoramento realizado pelo LASA no Cerrado — e que já vem sendo feito no Pantanal desde agosto — ajuda a preencher uma lacuna de dados de monitoramento fornecidos em tempo quase real capazes de calcular a extensão da área queimada, e não apenas apontar os pontos de focos de calor, como já faz o INPE com o Programa Queimadas. O objetivo dos dados é auxiliar gestores e equipes de combate a melhor planejar a alocação de recursos e esforços.

“Foco de calor é a informação do ponto onde está queimando, o que é útil pro combate, mas ficava sempre a lacuna de quanto estava queimando. Em geral essas informações de áreas queimadas vinham com um atraso muito grande, só meses depois”, conta Renata Libonati, professora do Departamento de Meteorologia do Instituto de Geociências da UFRJ e uma das coordenadoras do LASA.

Diferente do que é feito atualmente no Pantanal, os dados do monitoramento do Cerrado são individualizados por área protegida — unidades de conservação federais, estaduais e privadas (com exceção de Áreas de Proteção Ambiental), e Terras Indígenas. Além da extensão queimada atualizada com boletins semanais, também são compartilhados mapas que mostram o avanço temporal do fogo por determinadas áreas ou regiões.

Mapa produzido pelo monitoramento identifica o avanço do fogo na região do Araguaia, a mais atingida pelo fogo em 2020. Fonte: Sistema ALARMES/LASA

“Essa é uma informação útil para quem está fazendo o planejamento, a gestão e o combate do fogo nas unidades de conservação e áreas protegidas. Esse monitoramento vem ajudar a tomada de decisões durante a ocorrência do evento. Permite identificar melhor as áreas que queimaram e estão queimando e planejar como alocar os recursos e as equipes, quais são as áreas prioritárias. E também dar uma resposta mais rápida em termos de perícia, para aplicar possíveis multas e os órgãos ambientais conseguirem agir de forma mais ágil”, acrescenta Renata.

Como o objetivo principal é funcionar como um sistema de alertas para rápido uso dos gestores, os dados possuem uma margem de erro de 20% para mais ou para menos. A própria equipe do LASA se encarrega de ir, com o tempo, checando as informações através de imagens de satélites com resoluções maiores. “Para determinadas regiões, nós fazemos o mapeamento dessas imagens de alta resolução — de 20 ou 30 metros — e comparamos com o mapeamento automático [do sistema ALARMES] que tem 500 metros. E aí a gente faz essas comparações estatísticas para ver a acurácia do modelo”, explica a coordenadora.

Diante da extensão de mais de 3 milhões de hectares queimados dentro de áreas protegidas, Renata pontua que é preciso lembrar que a presença do fogo no Cerrado é diferente de biomas florestais como a Amazônia ou a Mata Atlântica.

“O Cerrado é um bioma que se desenvolveu com o fogo. O que isso significa, que ele tem um regime de fogo próprio, natural, no qual a vegetação e a fauna se desenvolveu se adaptando a esse regime de fogo. Nem fogo zero é bom, nem muito fogo é bom, o ideal é que a gente tenha um balanço porque tudo que sai na normalidade do regime de fogo daquela região vai causar um impacto, tanto para menos quanto para mais. O que a gente tem visto é que o fogo mais intenso e mais duradouro e mais frequente vai ser prejudicial e bem impactante em termos de ecossistema para essa região”, contextualiza.

“A região do Araguaia queima bastante todos os anos. Mas em geral a gente observa uma diminuição da área queimada no Cerrado, como um todo, nas últimas duas décadas com exceção dessa porção mais ao norte que pega a região do MATOPIBA [fronteira entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia]”, completa a coordenadora.

Brigadistas do ICMBio durante ação de Manejo Integrado do Fogo. Foto: Duda Menegassi

Outro desdobramento do monitoramento realizado pelo LASA é acompanhar a eficácia de estratégias de queima prescrita de aceiros e do Manejo Integrado do Fogo, técnicas que consistem em eliminar, através de um fogo controlado, o combustível orgânico de determinada área, para barrar incêndios e evitar que eles se alastrem. Essa área queimada de forma controlada, entretanto, não teria muito relevância dentro dos dados gerais do monitoramento.

“Por volta de 90% do fogo no Cerrado ocorre no período seco — junho a outubro — e a queima prescrita ocorre bem no início dessa transcrição, entre maio e junho. A área queimada durante essas queimadas prescritas é muito pequena e não tem um impacto — em termos de Cerrado como um todo. Vão se queimando pequenas parcelas de forma a diminuir a massa orgânica e fazer barreiras físicas para que o fogo não avance na época seca. Provavelmente a gente está pegando fogo de Manejo Integrado do Fogo, mas a contribuição disso pro total da queimada não é significativa”, esclarece Renata Libonati.

Confira a página do LASA com as informações sobre o avanço das queimadas no Cerrado.

 

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    Jornalista ambiental especializada em unidades de conservação, montanhismo e divulgação científica.

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